quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Haja padrão

Tentei me conter para não fazer a denúncia a seguir. Afinal, a proposta do blog é estudar erros COMUNS no cotidiano jurídico.

Entretanto, é urgente que alguém no CNJ aja para que não haja mais deslizes como o que se vê nesta notícia:



quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Sem a pretensão de exaurir o tema

Ô clichezinho torpe! Vai ser abusado assim longe!

Permita-me uma grosseria. Suponho que você nem saiba o que é um artigo de revisão. Não porque seja desinformado, mas porque não é um caminho metodológico com o qual nossas escolas de Direito costumam lidar.

É num artigo de revisão que o autor intenta dissecar por inteiro o assunto que escolheu para pesquisar, inserindo TODAS as contribuições científicas relevantes a ele relativas. Por isso, acho muitíssimo provável que
a informação (de que você não vai exaurir seu belo tema) seja completamente dispensável. Pra ser mais preciso, nem um artigo de revisão esgota um tema. Ele pode até esgotar o histórico da pesquisa realizada até o momento em que é feito. Entretanto, se é um debate verdadeiramente científico, é da sua essência que nunca se acabe.

Exemplos de “delícias” – essa sim, merece aspas – com as quais esbarramos o tempo todo:

clareza solar;
requinte de crueldade;
ínclitos julgadores;
não merece prosperar;
festejado autor;
por ser medida da mais pura e lídima JUSTIÇA!


Vindas de um estudante, até se perdoa. Mas é inadmissível que um profissional do Direito não tenha uma carga de leitura suficiente para perceber que esses ditos já estão mais que desgastados.

Aos olhos dos mais cultos e minimamente exigentes, um simples “ledo engano” é capaz de destruir a imagem do seu reprodutor, que passa a ser visto como alguém incapaz de inovar. É o tipo de expressão que, de tão enfadonha, casa bem com uma situação jocosa. Não é o caso da sua petição nem do seu artigo, certo?

Guerra aos clichês! Vivas à criatividade!

PS: Se você acha que isso tudo é chatice minha e, por acaso, além de estudante de Direito, é flamenguista, católico, tem inveja dos ministros do STF e uma imitação de iPod na gaveta, nem precisa clicar aí embaixo e comentar.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

A súmula e a vírgula

Toda honra e toda glória agora e para sempre às gramáticas. É com elas que aprendemos a falar que preste. Ou não. O danado é que elas não ensinam quem chegou atrasado no bonde e não tem tempo de voltar à Gênese para entender o Apocalipse.

O cara não se graduou em Letras e acabou de virar assessor do ministro do STJ que sempre admirou até pelo nome estiloso. Vai reler um voto que preparou e fica com dúvida sobre o uso de vírgula numa frase. Faz o que? Forca, claro! Se ele abre a gramática e ela diz isso:

Não se usa vírgula separando termos que, do ponto de vista sintático, ligam-se diretamente entre si (como sujeito e predicado) ou para marcar intercalação do adjunto adverbial.

Ai, ai, ai. Pra começar, “ponto de vista sintático” foi uma expressão que o deixou nervoso, sem chão, especialmente porque ele ainda vai ter que pesquisar o ponto de vista do ministro pra adivinhar se o voto está no rumo certo. Depois ele até sabe o que é sujeito e predicado, mas nessa frase... Hmmm. Aí vem a intercalação do adjunto adverbial. Prepara a corda e a cadeira!

Um falsário que não merece a posição que ocupa? Talvez. Resolva você os problemas dele ostente o direito de julgá-lo assim.

Em resposta mais uma vez ao presidente da Comissão de Direitos Humanos da 1ª Câmara o diretor no exercício das atribuições conferidas pelo regimento informou que por conta das graves acusações à sua equipe determinou sem prejuízo da competência de outras instâncias a instauração de inquérito administrativo.

Um período desses, com 47 palavras, só é construído por quem não teve que ler muito no trabalho. Essas “anacondas” são o terror de quem precisa usar a concentração com coisas mais importantes que entender um mero relato de fatos. Espírito de equipe conta muito nessas horas em que precisamos tornar a vida mais prática.



Verdade seja dita. Algumas vírgulas resolvem o problema do assessor no aspecto gramatical, mas eu duvido que o ministro do nome estiloso não dê importância à Estilística e para atender a isso – convenhamos – ele vai precisar de mais. Vai precisar de pontos para quebrar esse período nuns três, largar mão dessa tara por ordem inversa e contar essa história de forma menos afobada.

Eis a correção (apenas gramatical) do enunciado:

Em resposta, mais uma vez, ao presidente da Comissão de Direitos Humanos da 1ª Câmara, o diretor, no exercício das atribuições conferidas pelo regimento, informou que, por conta das graves acusações à sua equipe, determinou, sem prejuízo da competência de outras instâncias, a instauração de inquérito administrativo.

Foi fácil? Que ótimo! Então você não escorregaria num caso tão mais simples como o da súmula vinculante nº 19:

A taxa cobrada exclusivamente em razão dos serviços públicos de coleta, remoção e tratamento ou destinação de lixo ou resíduos provenientes de imóveis, não viola o artigo 145, II, da Constituição Federal.

Um alô para o pessoal do Supremo: a taxa pode não ter violado a Constituição, mas a proibição mais primária do uso de vírgula ela violou.

Ela só poderia estar aí, separando sujeito e predicado da oração, se houvesse uma expressão explicativa para a taxa no meio dos dois. Assim, olha:

A taxa verde, cobrada pelo serviço de coleta de lixo, não viola a Constituição.

Perceba a diferença. O que está intercalando os dois elementos sintáticos apareceu para acrescer uma informação sobre a taxa que não se incorpora ao sujeito. No caso da súmula, todo o trecho “cobrada exclusivamente... imóveis” está dizendo qual é a taxa, não apenas inserindo mais dados sobre um sujeito já especificado.

Essa redução que fiz aí em cima com o enunciado da súmula poderia ser batizado de “simplificação das estruturas sintáticas”. É uma boa técnica para clarear nossa visão e pontuar direito nossas vidas. Só que esse nome... Acho que é melhor deixar quieto.

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Mas você adora um se...


Bote uma coisa na sua cabeça: você não escreve bem inconscientemente. Se você não sabe se consegue agradar quem o lê, é porque não consegue.

Pra não ser mais um chatolino de plantão, vou apenas tentar demonstrar como algumas tentativas de fazer bonito
sem as dicas deste blog podem fazer você se dar mal. Naturalmente, se você estiver disposto a pegar pesado na gramática para aprender tudo o que ficou perdido em 10 anos de escola, dou todo apoio. Mas se você não tiver esse espírito heroico todo, vamos lapidar juntos o seu dom de escrever com alguns caminhos, digamos, intuitivos.

Os posts com o marcador “enxugue sua língua” trarão as mais atrapalhadas experiências de rebuscamento de frases. Até você se tornar um membro da ABL, tenha em mente que o jeito limpo de escrever será sua melhor jogada.

Diga pra mim qual a necessidade de usar a palavra “se” nestas construções e eu lhe dou um iPod nano:

Deve-se emitir o provimento sem ouvir-se a parte contrária.

Compreender-se os efeitos produzidos pelos princípios é importante para a sua utilização prática.

É interessante se notar que, na Lei de Crimes Ambientais, a maioria das tipificações trata-se de normas penais em branco.

Esse caso de exclusão pretende garantir a lisura do processo eleitoral, afastando-se os eleitores que tenham incorrido na hipótese de cancelamento descrita no artigo 71 do Código Eleitoral.

Que tal você parar um minuto pra refletir sobre a dispensabilidade de cada palavra que usa? Não dá, né? Tudo bem. Mas tente lembrar que uma frase com “se” sobrando perde seu valor – quem sabe recorrendo a Djavan – e a refaça com verbos mais desapegados. Olha só que belezura:

Deve-se emitir o provimento sem ouvir a parte contrária.

Compreender os efeitos produzidos pelos princípios é importante para a sua utilização prática.

É interessante notar que, na Lei de Crimes Ambientais, a maioria das tipificações trata-se de normas penais em branco.

Esse caso de exclusão pretende garantir a lisura do processo eleitoral, afastando os eleitores que tenham incorrido na hipótese de cancelamento descrita no artigo 71 do Código Eleitoral.

Notou que ainda ficaram alguns? Pois é. Se você ficou em dúvida sobre a correção deles, aí eu sugiro um "usos do se" no Google. Mas garanto que a técnica de enxugamento proposta pode te fazer perder uns quilos.

Aspas indignas



Quando você usa aspas? Tenho lido muitos textos com uso inadequado deste sinal gráfico, mas entendendo o motivo do deslize.

Justamente com a preocupação de escrever correto, as pessoas metem as aspas para pedir perdão pelo uso de uma palavra que julgam indigna de compor seu texto. É como se faltasse um termo apropriado e ficasse justificada a presença daquele ser estranho.

Encontrei o seguinte exemplo vindo de um professor de Português.

Quem estiver a fim de trocar idéias sobre o que mais "cai" nas provas, tirar dúvidas acerca de nossa língua etc., terei prazer em ajudar.


Caríssimos, a palavra cai está usada de maneira absolutamente adequada. Vejam o que diz o dicionário Houaiss:

15. caber por acaso ou sorte Ex.: {a nova turma caiu com o melhor professor de literatura} {na prova oral, caiu o ponto que ele sabia} transitivo indireto


Viu? A definição tanto corresponde ao uso no caso mencionado que o exemplo dado no dicionário foi quase o mesmo.

Outro exemplo:

Pelo que foi colocado, o pagamento de “jeton” não tem previsão na Lei 6.404/76 (e alterações)

Há vários usos para esse sinal gráfico. A hipótese que foi desviada, no caso, é a de ocorrência de uma utilização polêmica ou conotativa da palavra entre aspas (1), ou ainda que esteja descompassada do estilo integral do texto (2).

Exemplo correto do uso 1:

Para que o movimento grevista não acabe se transformando numa “pizza”, os diretores do sindicato diminuirão o tom agressivo das reivindicações.


Exemplo correto do uso 2:

O apelante se insurge contra as afirmações de que sua associação seria uma “caixa-preta” e demonstra que nenhuma conduta praticada pelos seus membros deturpa os bons costumes.